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Consciência negra: orientação e atendimento em saúde devem analisar particularidades de raça 

O Dia da Conscientização Negra, comemorado em 20 de novembro, é uma data de celebração da negritude e da luta da população preta no país. É momento de reflexão e busca de uma sociedade mais igual. Para isso, entretanto, é necessário observar distintas realidades e ter coragem para agir conforme o cenário, garantindo que o conceito de equidade possa ser alcançado. 

Na área da saúde, o Dia da Consciência Negra pode ser oportunidade para pensar como essa população precisa ser atendida e orientada de forma efetiva dentro de suas próprias necessidades. Em 2009, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), com o objetivo de estabelecer diretrizes para promoção, prevenção e tratamento de saúde para pessoas pretas e pardas. Em 2021, 1.781 municípios brasileiros informaram que incluíram em seus planejamentos de saúde ações previstas nessa política, o que representa 32% dos mais de 5.500 municípios brasileiros. O levantamento é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).  

Os profissionais de saúde e os hospitais também precisam estar em consonância com a necessidade de atendimento universal e eficaz para todos. “As formações da área da saúde hoje enfatizam a importância de entender diferentes contextos para atendimentos efetivos a todas as populações. É importante que os profissionais entendam a universalidade brasileira e, ajudando indivíduos e suas famílias, possam contribuir para uma sociedade mais igualitária”, analisa a cardiologista do Hospital São Marcelino Champagnat, Camila Hartmann. 

Doenças mais comuns 

Em novembro de 2022, o Ministério da Saúde divulgou o Boletim Temático de Saúde da População Negra. A publicação aborda doenças que são predominantes em pessoas pretas em virtude de fatores genéticos, mas também fatores sociais e ambientais.  

Anemia Falciforme: doença caracterizada pela alteração de glóbulos vermelhos no sangue . Devido ao formato diferente, que fica parecido com uma foice e por isso o nome da doença, as células rompem de forma facilitada, causando anemia. Na população preta, a frequência da doença varia de 6% a 10% dos indivíduos, enquanto na população brasileira em geral a variação vai de 2% a 6%. A detecção é feita com exame eletroforese de hemoglobina. O teste do pezinho, feito gratuitamente nas maternidades, proporciona a identificaão precoce. O tratamento prevê acompanhamento vitalício do paciente, para melhor orientação e prevenção de sintomas graves. 

Diabetes mellitus (tipo II): tipo de diabetes desenvolvida na fase adulta, atinge com mais frequência mulheres negras (em torno de 50% mais frequência na comparação com mulheres brancas). Entre os homens, atinge 9% mais negros que brancos. A doença é caracterizada por disfunções metabólicas que levam a níveis elevados de glicemia. Diagnóstico normalmente é feito com exame laboratorial de sangue. A doença não tem cura, mas há tratamento para o controle. É necessário fazer uso de medicamentos que auxiliam no controle da glicemia, bem como manter hábitos de alimentação saudável, prática de exercícios físicos, sono adequado e controle do stress. 

Hipertensão arterial: ocorre quando a medida da pressão arterial do indivíduo mantém-se frequentemente acima de 140 por 90 mmHg. Em geral, a doença é mais prevalente em homens, e tende a atingir um pouco mais a população preta, de ambos os sexos. Hipertensão arterial não tem cura, mas é possível realizar o controle. As orientações são evitar cigarro e álcool em excesso, manter peso adequado, ter alimentação saudável e praticar exercícios físicos.  

Deficiência de G6PD (Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase): a falta dessa enzima resulta na destruição dos glóbulos vermelhos, levando à anemia hemolítica. Afeta mais de 200 milhões de pessoas no mundo, sendo mais comum na população preta. Por ser um distúrbio genético ligado ao cromossomo X, é mais frequente nos meninos. 

“É importante observar que duas dessas doenças (diabetes e hipertensão) podem ser controladas com hábitos saudáveis. As orientações sobre comer moderadamente, fazer exercícios físicos com regularidade e ter um sono de qualidade devem ser seguidas para quem quer viver bem”, explica a cardiologista.   
 

Fatores socioeconômicos 

Segundo dados do Ministério da Saúde, a população negra no Brasil detém os piores indicadores de saúde. As doenças infecciosas, por exemplo, afetam, em sua maioria, pessoas negras. O fato não ocorre por predisposição do organismo, mas por menos acesso aos serviços de saúde e de saneamento básico. 

A publicação Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil (IBGE, 2019), revela que 42,8% das pessoas pretas ou pardas não têm esgoto por rede coletora ou pluvial, contra 26,5% da população branca. Além disso, 12,5% dos negros no país moram em domicílios sem coleta de lixo, enquanto entre brancos o percentual é de 6%. 

Sobre a saúde da mulher preta também cabe destaque. O Dossiê Mulheres negras e justiça reprodutiva, publicado pela ONG Criola, em 2021, aponta que elas são maioria nos casos de mortalidade, violências e também situações de aborto. O documento indica que 65,9% das mortes maternas ocorrem entre mulheres negras. A Pesquisa Nascer no Brasil, da Fiocruz, aponta que as mulheres negras têm prevalência mais alta de parto pós termo (após 42 semanas de gestação), além de possuírem pré-natal com menor número de consultas e exames na comparação com outras populações.  

 
O desafio é grande para buscar a igualdade entre os cidadãos, conforme garante a Constituição Brasileira. Além de estabelecidas formalmente, as políticas públicas precisam ser executadas pelas prefeituras, governo de estados e governo federal. Aos médicos cabe pôr em prática o que está previsto no artigo I, do capítulo I do Código de Ética. “A medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza”. “O problema é complexo, mas dar luz a ele é essencial. A data da Consciência Negra também é uma oportunidade para falar sobre acesso à saúde para a população preta. Se quisermos diminuir desigualdades – e a maior parte dos brasileiros verdadeiramente quer que isso ocorra – não podemos nos omitir”, completa Hartmann.  

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